terça-feira, 20 de novembro de 2012

Os Direitos Sociais e o problema da densificação (I)

Hoje muito em voga, os direitos sociais constituem um avanço civilizacional, uma garantia do Estado social aos seus cidadãos. Com a expressão direitos sociais, para o âmbito deste textos, englobarei também os restantes direitos económicos e culturais.
 Nos primeiros tempos do Direito Administrativo esta problemática, hoje central e fatal, não se colocava. O primeiro tipo de Estado a autonomizar juridicamente a Administração foi o Estado liberal, minimalista por natureza na sua intervenção social. O fulcro da sua existência era assegurar os direitos políticos fundamentais  à comunidade, não se considerando adstrito à consagração e concretização dos direitos sociais, culturais e económicos, os quais, para relativizar esta lacuna na actuação estatal, estavam pouco desenvolvidos dogmaticamente. Cabe dizer que este absentismo social do Estado foi-se amenizando com o avançar do século XIX, e a Revolução Industrial,ao acentuar exponencialmente o fosso entre os mais ricos e os mais pobres, foi decisiva no incremento da "acção social" do Estado.
 É vulgar localizar a primeira manifestação do que depois seria o Estado Social na Prússia (posteriormente Alemanha) de Bismarck, que, para diminuir as tensões sociais num país em rápida industrialização, estabeleceu a primeira política de atribuição de direitos e regalias sociais aos trabalhadores. No entanto, este Estado era autoritário, um Império centrado no kaiser. Os Estados liberais só adoptam plenamente as políticas sociais no século XX, e com colossais diferenças entre os diversos países.
 Considero que o Beveridge Report (Reino Unido, 1942, base do welfare state implementado no pós-guerra) e o Second Bill of Rights (Estados Unidos da América, 1944, conjunto de medidas sociais propostas por Roosevelt) são os momentos mais decisivos na política social subsequente na maioria dos Estados ocidentais, por simbolizarem um novo paradigma de poder público, inaugurando, em grande medida, o "Estado prestacional".
 Quanto ao panorama estritamente português na actualidade (mas que se assemelha ao da maioria dos países europeus). Os direitos sociais estão constitucionalmente consagrados mas, em virtude do carácter programático destas normas, e da necessária margem de manobra do legislador ordinário, carecem de densificação para que se tornem pragmaticamente operacionais, e a principal obrigação que a nossa Constituição acarreta a este nível é a de legislar. Quanto a qualquer salutar referência a um limite mínimo que o Estado se pode arrogar a prestar, é já um problema de densificação normativa e, ulteriormente, um problema de interpretação da Constituição pelo próprio Tribunal Constitucional.
 Toda a controvérsia dos direitos sociais orbita em torno da "densificação". Esta é uma actividade indispensável na concretização dos direitos sociais, e é prerrogativa do Governo. Assim, está sujeita, como qualquer acto do Governo, a fiscalização da constitucionalidade.
 Foram avançados alguns conceitos para parametrizar a actuação da Constituição, nomeadamente o do não retrocesso social. Este critério, puramente doutrinal, tem inerente uma de duas opções: - ou uma visão linear positiva do panorama económico e da capacidade orçamental do Governo, que resulta manifestamente desligada do real, ou uma concepção financeira extraordinariamente optimista dos cofres do Estado, tidos como capazes de garantir em aboluto uma melhoria ad eternum. Além das considerações já feitas, o próprio conceito é indeterminado e pouco comensurável, pressupondo uma capacidade analítica enorme. Além disso, qualquer critério puramnete doutrinal é de pouca valia numa área socialmente tão relevante. Concluindo, apesar de bem-intencionado, tal critério é demasiado rígido e abstracto para ser fundamento de obrigações jurídicas que contribuam para solucionar o problema.

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