terça-feira, 20 de novembro de 2012

Os Direitos Sociais e o problema da densificação (II)

 Os direitos sociais estão constitucionalmente consagrados e são muito importantes na vida quotidiana da comunidade, pelo que é ao nível da Constituição que o tema deve ser tratado.
 Compreende-se, no entanto, a tendência governamental (como sucede com o actual Governo) de usar a via meramente legal para definir a sua política quanto a este tópico. Tal sucede por duas razões principais, uma vez que é mais difícil e demorado processar o problema a nível supra legal, e as soluções seriam vincadamente mais compromissórias (o que eu não considero problemático, desde que não suceda bloqueio sistemático e o espírito seja de cooperação estratégica, requisitos que não estão actualmente inequivocamente reunidos), e a segunda razão prende-se com a própria natureza constitucional, sendo desproporcionado equacionar nova revisão a cada ajustamento da política de prestações estatais. No entanto, como hierarquicamente a Constituição prevalece sobre a lei, é a esse nível que procurarei analisar a questão.
 A Constituição deve enformar a vida jurídica da comunidade, no entanto, confrontada com a impossibilidade (financeira, sobretudo), a CRP corre o risco de perder parte da sua eficácia. Ao não tratar diferenciadamente a impossibilidade do incumprimento (questão difícil de concretizar mas cujos quadros mentais encontram-se profundamente estabelecidos no Direito Privado), acarreta uma camada adicional de insegurança jurídica.
 O actual Governo, provavelmente mais por cautela política do que por convicção, procura que a sua actuação nesta área não tome a forma de lei de revisão constitucional, no entanto, medidas do tipo das que estão previstas suscitarão pedidos ao Tribunal Constitucional para verificação da sua conformidade com a Constituição. Na minha opinião, a CRP terá de ser revista, e os actores políticos terão de agir concertadamente e com sensibilidade social, adaptando o paradigma da actuação social estatal ,conferindo nova dinâmica à Constituição deste país, contribuindo decisivamente para que esta garanta os interesses legítimos dos cidadãos.
 Outro aspecto decisivo neste processo seria a ponderação sobre a estrutura e funcionamento do Tribunal Constitucional, mas cujo aprofundamento é matéria que transcende o mero Direito Administrativo.
 Um ponto de partida interessante seria, por exemplo, estabelecer uma correlação entre as prestações sociais e o Orçamento estatal, e mais uma vez é um problema de densificação. Reconheço também que qualquer solução deste tipo enfrenta obstáculos importantes: as prestações sociais do Estado crescem a um ritmo mais rápido do que as receitas ( e a base deste raciocinio é a demografia), alargando inexoravelmente o fosso; tendencialmente, as soluções mais abruptas pecam por injustiça social, e sem conscencialização nem apoio popular qualquer movimentação política neste sentido falhará, arrastando indefinidamente o debate.
 A Constituição de 1976, texto da Revolução e adaptada à nossa evolução democrática, não pode, sob pena de inutilizar parte dos seus preceitos, cristalizar "ad eternum" as suas opções. Não é por se ignorar (intencionalmente) um problema que ele deixa de ser relevante, e quanto mais tempo passar, mais radical, injusta e inaceitável a solução será. Os entitlements e as restantes prestações sociais são uma conquista essencial, a preservar dentro do possível, sendo também importante a optimização da afectação dos recursos financeiros e humanos.

Sem comentários:

Enviar um comentário