sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Natureza dos órgãos das pessoas colectivas




Todas as pessoas colectivas são dirigidas por órgãos, cabendo a estes manifestar a vontade imputável à pessoa colectiva. Nesta óptica, importa precisar a natureza destes órgãos, sendo que classicamente se distinguia entre duas posições antagónicas preconizadas por MARCELLO CAETANO (defendendo que os órgãos são instituições) e por AFONSO QUEIRÓ E MARQUES GUEDES (que defendem que os órgãos são indivíduos). Para além destas posições dicotómicas, importa referir a perspectiva de FREITAS DO AMARAL que assume uma posição intermédia.
Para MARCELLO CAETANO os órgãos são instituições e não indivíduos, fazendo uma distinção marcada entre órgão e titular, sendo que o primeiro é o centro de poderes funcionais e o segundo, a pessoa que exerce esse poderes em nome da pessoa colectiva (assim, Presidente de República ou Presidente da Câmara são órgãos, e as pessoas que desempenham as funções deste órgão são titulares – Dr. X não é Presidente da República, mas antes o titular do órgão “Presidente da República”). Desta forma, os órgãos são centros institucionalizados de poderes funcionais, a exercer pelos indivíduos ou colégios de indivíduos que neles estejam providos, com o objectivo de expressar a vontade juridicamente imputável à pessoa colectiva. Os indivíduos é que agem no mundo real em nome destas, mas agem como titulares dos órgãos, sendo estes um feixe de competências.
Contrariamente, para MARQUES GUEDES e AFONSO QUEIRÓ os órgãos são indivíduos e não instituições, uma vez que o órgão não é o centro de deveres e poderes. Nesta óptica, o centro de poderes e deveres de um órgão são as competências, sendo o órgão os indivíduos que agem de acordo com esse conjunto de poderes (ou seja, de acordo com a sua competência). Esta concepção defende que se definimos a pessoa colectiva através da pessoa a quem cabe tomar decisões em nome dela (a quem compete manifestar uma vontade imputável à pessoa colectiva), então o órgão tem de ser o indivíduo responsável pela tomada dessas decisões. Esta corrente vai mais longe, e tenta contestar a posição de MARCELLO CAETANO ao defender que esta é contraditória, uma vez que identifica o órgão como um centro de poderes funcionais mas defende que o Acto administrativo é a conduta voluntária de um órgão da Administração. Ora, na óptica de MARQUES GUEDES e AFONSO QUEIRÓ, não são os centros de poderes funcionais que adoptam condutas voluntárias, mas sim os indivíduos, concluindo que os poderes funcionais não são os órgãos, mas sim as competências.
FREITAS DO AMARAL assume uma posição algo que intermédia, reconhecendo que ambas correntes são em parte correctas, falhando apenas por tentarem explicar uma complexa realidade apenas com uma concepção. Assim, na perspectiva deste professor cabe ver a questão de dois prismas diferentes, o da organização administrativa e o da actividade administrativa, sendo que na primeira os órgãos teriam de ser vistos como instituições e na segunda teriam de ser vistos como indivíduos.
Na óptica da organização administrativa, tendo em conta que cabe analisar a composição de um órgão, assim como o seu funcionamento, o modo de designação e o estatuto dos seus titulares, os poderes funcionais atribuídos a cada órgão e como cada um destes órgãos por sua vez se relaciona entre si, não importa tanto os indivíduos que exercem as funções como interessam as funções em si mesmas, ou seja o conjunto de poderes funcionais. Assim, numa perspectiva de organização administrativa, faz mais sentido tratar os órgãos como instituições contrariamente a indivíduos.
No entanto, tal já não se mostra correcto numa óptica de actividade administrativa, em que o que cabe analisar são as actuações e as decisões de praticar actos administrativos. Neste caso, releva ver o órgão como indivíduo, uma vez que são estes que praticam os actos administrativos, e concluindo que só faz sentido falar de órgãos como instituições para efeitos de organização administrativa.

Susana Gaboleiro (nº22544)

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